Rodrigo Paz presidente da Bolívia põe fim a 20 anos de esquerda

Rodrigo Paz presidente da Bolívia põe fim a 20 anos de esquerda

Quando Rodrigo Paz Pereira, senador de 58 anos do Partido Demócrata Cristiano, foi declarado vencedor da segunda volta das eleições presidenciais da Bolívia, o país viu‑se diante de uma mudança histórica: encerra‑se duas décadas de governos liderados pelo Movimento ao Socialismo (MAS) de Evo Morales.

Contexto histórico e a crise econômica

Desde a vitória de Evo Morales em 2006, a Bolívia adotou uma política de nacionalização de recursos e fortalecimento do Estado plurinacional. A Constituição de 2009, impulsionada por Morales, reconheceu direitos indígenas e ampliou o papel do Estado na economia, sobretudo na extração de lítio.

Entretanto, o fim do mandato de Luis Arce Catacora, que assumiu em 2020, coincidiu com a pior crise econômica dos últimos 40 anos: inflação anual de 7,8 %, contração do PIB de 5,2 % no segundo trimestre de 2025 e reservas internacionais reduzidas a US$ 2,1 bilhões, conforme relatório do Banco Central da Bolívia de setembro de 2025.

Detalhes da eleição de 2025

O pleito foi realizado em 19 de outubro de 2025, com 14.257 mesas em nove departamentos. A primeira rodada, em 6 de setembro, deixou o sen­ador Paz à frente com 38,6 % dos votos, superando o ex‑presidente Jorge "Tuto" Quiroga (32,1 %) e o candidato do MAS, David Choquehuanca (26,4 %).

A segunda votação, apurada pelo Tribunal Supremo Eleitoral (TSE), confirmou a vitória de Paz com 54,5 % dos votos válidos contra 45 % de Quiroga, margem de 9,5 pontos percentuais. O TSE certificou os resultados às 20h11 (UTC) de 20 de outubro, depois de processar 97,3 % dos atos eleitorais.

Nas regiões decisivas, Tarija destacou‑se: Paz obteve 68,3 % dos votos, enquanto em Santa Cruz alcançou 62,4 %. Por outro lado, o menor apoio veio de Potosí, onde a diferença foi mínima (51,7 % a favor de Paz).

Reações dos principais protagonistas

Em Plaza Murillo, La Paz, apoiadores de Paz celebraram com música típica, fogos e bandeiras verde‑branco‑vermelhas. O próprio vencedor declarou: "O exercício do voto está acima da guerra suja que marcou a campanha".

Quiroga, em entrevista à CNN poucos dias antes da apuração final, prometeu acabar com a suposta "santuário" para traficantes e focar em propostas ao invés de "calúnias e insultos".

Evo Morales, que votou em Cochabamba, acusou os vencedores de racismo e perseguição aos povos humildes, enfatizando que o verdadeiro perdedor são os que odam a diversidade.

Implicações políticas e econômicas

Implicações políticas e econômicas

O novo governo herda a maior bancada do Partido Demócrata Cristiano no Legislativo: 42 cadeiras na Câmara dos Deputados e 18 no Senado, mas ainda precisará negociar com a aliança de Quiroga, que detém 31 e 11 cadeiras, respectivamente. Essa configuração sugere acordos difíceis em reformas fiscais e renegociação dos contratos de lítio com montadoras europeias.

Analistas da Fundação Milenio apontam que a prioridade será estabilizar o boliviano (câmbio atual: 6,92 BOB/USD) e quitar US$ 1,3 bilhão em salários atrasados do setor público. Espera‑se também um reposicionamento geopolítico: o Ministério das Relações Exteriores pretende restabelecer laços com os Estados Unidos e a União Europeia em até 180 dias, revertendo a aproximação com Caracas e Havana que marcou a era Morales.

Próximos passos e transição presidencial

O período de transição vai de 20 de outubro de 2025 até a cerimônia de posse, marcada para 22 de janeiro de 2026 no Palácio Quemado, em La Paz. Durante esse intervalo, Paz deve nomear seu gabinete, incluindo ministro da Economia e ministro das Relações Exteriores, e apresentar o plano de ação para os próximos cinco anos.

Especialistas alertam que, embora a vitória de um candidato de centro‑direita represente uma guinada, a profundidade das reformas dependerá da capacidade de conciliar os diferentes blocos no Congresso e de gerir a pressão social que ainda clama por mais inclusão dos povos indígenas.

Perguntas Frequentes

Como a vitória de Rodrigo Paz pode afetar a economia boliviana?

Paz promete estabilizar o boliviano e renegociar contratos de lítio, o que pode atrair investimentos estrangeiros. Ao mesmo tempo, a necessidade de acordos com o Congresso pode limitar reformas fiscais agressivas, mantendo a inflação sob controle, mas exigindo cautela nas políticas de gasto público.

Quais mudanças diplomáticas se esperam após a posse?

O Ministério das Relações Exteriores indicou que a Bolívia buscará restabelecer relações normais com Washington e a UE dentro de seis meses, o que pode abrir portas para acordos comerciais e ajuda financeira, revertendo o alinhamento mais estreito com Venezuela e Cuba.

Qual é o papel do ex‑presidente Luis Arce na nova administração?

Arce deixará o cargo em 22 de janeiro, mas permanecerá como figura influente no MAS, que ainda controla 31 cadeiras na Câmara. Seu apoio ou oposição a projetos de lei será decisivo para a aprovação de reformas econômicas propostas por Paz.

O que a população espera do novo governo?

Após anos de crise, a população deseja mais empregos, controle da inflação e pagamento de salários atrasados. Ao mesmo tempo, grupos indígenas cobram respeito ao pacto plurinacional e políticas que não comprometam seus direitos territoriais.

Qual será o impacto na política de lítio da Bolívia?

Com a mudança de governo, espera‑se uma revisão dos contratos de extração com empresas europeias, possivelmente introduzindo cláusulas de royalties mais favoráveis ao Estado e estimulando projetos de valor agregado para a indústria local.

1 Comment

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    Mariana Jatahy

    outubro 20, 2025 AT 23:11

    A mudança de governo na Bolívia representa um ponto de inflexão significativo na história política sul‑americana. O eleito Rodrigo Paz Pereira assume o cargo com a promessa de estabilizar a moeda e atrair investimentos estrangeiros ao setor de lítio. Contudo, a herança de duas décadas de políticas nacionalistas impõe desafios estruturais que não desaparecerão da noite para o dia. A inflação, embora moderada em 7,8 %, ainda pressiona os consumidores mais vulneráveis, especialmente nas áreas rurais. O Conselho Nacional de Economia projetou que, sem reformas fiscais, o PIB pode continuar a registrar contração anual acima de 4 %. As negociações com a União Europeia exigirão transparência nos contratos de extração, o que pode reduzir a margem de lucro das empresas europeias, mas aumentar a receita do Estado. Ao mesmo tempo, a população indígena permanece cautelosa quanto à possível erosão dos direitos consagrados na Constituição de 2009. O novo gabinete deverá incluir representantes de comunidades locais para legitimar as decisões de uso de terra. A reaproximação com Washington pode abrir linhas de crédito, porém dependerá da capacidade de demonstrar governança econômica consistente. No cenário interno, a oposição liderada por Tuto Quiroga ainda detém blocos consideráveis no Congresso, o que tornará impossível a aprovação de medidas unilaterais. A estratégia de Paz de buscar consensos bipartidários pode, portanto, ser a única via para aprovar reformas fiscais necessárias. A experiência de países como o Chile, que também dependem do lítio, sugere que a criação de um fundo soberano pode amortecer flutuações de preço. Além disso, a implementação de políticas sociais voltadas ao pagamento de salários atrasados poderá aumentar a confiança popular no novo governo. A comunidade empresarial observa com otimismo cauteloso, pois a estabilidade jurídica é um pré‑requisito para investimentos de longo prazo. Em suma, o futuro da Bolívia dependerá da habilidade de Paz em equilibrar interesses externos, pressões internas e a necessidade de modernizar a economia, tudo isso enquanto preserva a identidade plurinacional do país. 😊

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